Já pensou se hospedar com muito conforto em uma reserva indígena em um dos parques nacionais com maior biodiversidade do mundo e ainda desfrutar de experiências incríveis na selva? É possível na Amazônia Equatoriana podendo escolher entre as cabanas simples próximo à comunidade ou as palafitas luxuosas na beira do lago. Neste artigo, conto como passar dias imersos na natureza tanto no Napo Wildlife Center quanto no Napo Cultural Center. Ambos 100% administrados por indígenas e maior case de sucesso de turismo de base comunitária do Equador.
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Para entender como é especial se hospedar nos lodges Napo, vale saber a história primeiro.

A linda história empreendedora de Napo
Localizado no Parque Nacional Yasuní, ao norte de Quito, é o único empreendimento permitido a permanecer ali e assim fazem há 26 anos.
A primeira geração de empreendedores foi ousada quando a exploração de petróleo virou a grande riqueza da região (atualmente a maior fonte de renda com exportação no país). Os povos indígenas tiveram a escolha de obter lucro deixando as petrolíferas extraírem nas suas terras, mas alguns membros da comunidade Kichwa Añangu1 tinham experiência de trabalhar em lodges na Amazônia e propuseram construir seu próprio hotel de selva para investir em turismo e preservação. Não foi fácil, criaram o projeto, conseguiram investimento estrangeiro e construíram com suas próprias mãos o Napo Wildlife Center em um dos pontos profundos e de acesso complicado da selva equatoriana.
O sucesso foi tanto que permitiu pagar a dívida, virou cooperativa com cerca de 200 membros, de 33 famílias, onde toda a comunidade colhe os frutos e não depende de assistência do governo ou nenhuma ONG. Eles têm escola de qualidade, posto de saúde e conseguiram passar pela pandemia sem faltar nada, mesmo não abrindo aos turistas por quase dois anos. Fruto de uma excelente administração, onde os jovens têm escolha de estudar fora e voltar com um bom emprego garantido ou permanecer trabalhando, onde suas habilidades são aproveitadas na comunidade.
O gestor atual, David Grefa, acompanhou a nossa viagem e foi esclarecendo as nossas dúvidas sobre todo esse movimento de criação de oportunidades de emprego somado às iniciativas de desenvolvimento sustentável, preservação cultural e educação ambiental.
Assim como as gerentes de cada hospedagem contaram como esse desenvolvimento trouxe oportunidades e empoderamento para as mulheres também terem a escolha de se desenvolver profissionalmente, as irmãs Rivaneyra são da segunda geração e preparam seus filhos e primos para a próxima gestão.
- Kichwa veio de Quechua, dos Incas. ↩︎
Turismo sustentável
Os Kichwa Añangu reuniram todo o conhecimento tradicional de quem nasceu e vive na selva com a tecnologia disponível para aproveitar os ambientes naturais com o mínimo impacto. Energia solar, internet por satélite, cabanas, caminhos e torres desenhados para o conforto do turista, estão entre os destaques do lodge.
No processo de desenvolvimento do empreendimento, eles entenderam a importância de preservar e optaram por abandonar alguns hábitos ancestrais, como não mais caçar ou pescar na reserva. Possuem pequenas hortas com o mínimo necessário para consumo próprio e compram os demais alimentos e produtos nos mercados próximos ou na cidade El Colca. Dessa forma, fazem o dinheiro do turismo circular na região e deixam a floresta seguir o seu ritmo natural. Além de investir os lucros em manejo sustentável da floresta e em projetos que melhoram a qualidade de vida da comunidade.

Napo Wildlife Center
O primeiro empreendimento é um ícone arquitetônico que impressiona ao chegar de canoa. São 12 cabanas ecológicas em palafitas para casais ou famílias, algumas com hidromassagem em ambiente envidraçado para a selva onde vi bugios brincando bem próximo à janela e uma com piso de vidro. Todas com vista para o lago. O ponto mais alto é a torre de observação localizada acima do restaurante, vale subir para ver a vista de toda a propriedade, floresta e lago ao redor.









É a opção luxo e funciona como um resort de alto padrão. Exige 3 diárias como mínimo e tem programação para ficar até 8 noites. O hóspede contrata o pacote conforme as atividades e dias disponíveis.
Informações e reservas pelo site.
Napo Cultural Center
Quem opta pelo Napo Cultural Center economiza na hospedagem por serem cabanas mais simples e vista para o jardim, mas continuam confortáveis e pode usufruir de todas as atividades oferecidas nos pacotes, além de estar inserido no coração da comunidade.
São 16 cabanas com água quente no banho, ventilador, armário e varanda com rede. Quatro são para família com beliche e cama de casal. Uma trilha iluminada leva para a casa principal onde as refeições são servidas. Café da manhã, almoço e jantar conforme hora marcada e mesa com chás e cafés sempre disponível. Também tem um bar e sala de conferência onde aprendemos muito sobre a região com o guia Jairo Sanchez.





A permanência mínima é de 2 noites, fiquei 3 no Napo Cultural Center e foi maravilhoso, mas sempre dá vontade de ficar mais. Informações e reservas pelo site.
Incluso em todos os pacotes
Transporte fluvial e terrestre desde El Coca, toalha refrescante e drink de boas-vindas, todas as refeições (bebidas alcoólicas não inclusas), entrada no Parque Nacional Yasuní e guias. Como brinde os hóspedes ganham boné, saco estanque e garrafa d’água.

Parque Nacional Yasuní
O parque de mais de um milhão de acres no centro da Amazônia Equatoriana abriga a maior diversidade de fauna e flora por metro quadrada do planeta, isso rendeu o título de Reserva da Biosfera da UNESCO. E esse território é só um pedacinho da maior floresta tropical do mundo, mas tão intocado que nos presenteia com uma biodiversidade impressionante na maior área protegida do Equador. Localizado na província de Napo.

Atividades
Para evitar o calor úmido e intenso, é preciso acordar cedo e deixar para descansar no pós-almoço, então a programação é retomada por volta das 16h até o início da noite.

Todas as atividades são conduzidas por guias e naturalistas bilíngues (inglês e espanhol) e muito experientes, inclusive, ao menos um deles sempre será da etnia Kichwa. Além de especialistas na fauna e flora da Amazônia, eles são tão empolgados quanto o nosso grupo ao mostrar as espécies encontradas. Possuem olhar aprimorado para identificar no meio daquele verde sem fim até o animais mais camuflados como mini morcegos em um tronco na nossa cara quando foi preciso apontar com luz para identificarmos. Os bichinhos estavam todos com a cabecinha em pé olhando para gente.


Jairo Sanches, Milton Avalos, Lucas Mamallacta e Ivan Francisco Greta Vargas foram os nossos condutores em todas essas atividades:
Trilhas
Desde caminhadas leves ao redor do lodge até trilhas mais pesadas com subida em torres apoiadas nas árvores mais altas (até 40 metros) ou noturnas entre os insetos peçonhentos, em todas observamos aves, árvores ancestrais, fauna e flora com explicações detalhadas sobre as espécies. Foram tantas que terá um artigo exclusivo sobre os animais do Equador.

Imersão cultural
Administrada pelas mulheres da comunidade que escolheram esse trabalho, Kuri Muyu Interpretation Center exibe a cultura Kichwa através de apresentações, demonstrações, degustações e venda de artesanato. Duas estruturas com telhado de palha são mantidas como antigamente, uma retangular de reunião e celebração e a outra é a cozinha, uma maloca com alimentos e objetos antigos e atuais utilizados pela etnia.
Visitei em duas oportunidades, primeiro para a apresentação tradicional e fui convidada para a cerimônia do chá Guayusa (Guayusada). Neste último, muita cafeína para começar a jornada diária ainda na madrugada (não esqueça de passar repelente). Enquanto tomávamos a tradicional bebida quente, fizemos perguntas e ouvimos muitas lendas e histórias interessantes.

A apresentação tradicional envolve danças, instrumentos musicais, objetos do cotidiano e degustação de comidas típicas. Não fique com nojo de provar a larva, é realmente deliciosa e acabou super rápido. Por outro lado, não se empolgue demais e coloque tudo na boca como fiz, alguns alimentos são super apimentados e acabei sem paladar com a garganta pegando fogo por cerca de 20 minutos! Então disseram ser só para morder um pedaço, nem eles colocam tudo na boca.

Como curiosidade, o chá Guaysa ajuda a interpretar os sonhos e se for mau agouro, melhor nem sair para trabalhar naquele dia. Eles acreditam e respeitam essa tradição ainda hoje.
Observação de aves
Desde os passeios de barco as trilhas observamos muitos pássaros, principalmente quando subimos nas torres de observação apoiadas nas árvores mais altas da reserva. Os guias levam binóculos de alta qualidade e não só mostram como tiram fotos com os nossos celulares através do equipamento.

Outro destaque são os locais com argila onde papagaios, araras e periquitos se reúnem para lamber em determinadas horas do dia. Algo único observado pelos moradores que virou atração turística pelo acúmulo de aves em busca de nutrientes só encontrados nesses pontos. Os pássaros ficam atentos aos predadores e aí o espetáculo acontece com a revoada, mas também acaba porque ficam desconfiados para voltar. Por isso é importante chegar bem cedo e ver os primeiros se aproximarem, mesmo exigindo muita paciência da nossa parte, a experiência única compensa.

Canoagem no rio Napo
O momento que exigiu mais esforço físico foi no passeio de caiaque, mas porque adoro e fiz questão de sentir o vento no rosto remando rápido. Quem escolheu um dos guias como parceiro de remo pode escolher apenas contemplar as águas calmas do rio Napo. O passeio terminou com um belo pôr do sol.

Navegação contemplativa
No caminho para Napo Wildlife Center observamos muitos macacos, lontras, filhotes, aves e espécies camufladas contemplando o navegar sereno das águas escuras e espelhadas dos igarapés. Para ter uma ideia, o parque abriga 11 espécies de macacos e conseguimos encontrar 10. Outra alternativa que não fiz é o catamarã ancestral, mostrando como viajam os indígenas em grupo.

Um cuidado dos guias conosco é identificar os sinais da floresta para nos proteger. Estava um dia com sol entre nuvens quando nos entregaram as capas de chuva e pediram para vestir que a tempestade estava a caminho. Então ouvi um barulho se aproximando, foi terminar de colocar o capuz para a água nos atingir com força.
















O que levar
- Câmera fotográfica com lente teleobjetiva seria o ideal para registrar os animais, mas a minha estragou e ainda não comprei uma nova. Ainda bem que havia fotógrafos profissionais no meu grupo. No mínimo, leve um celular com proteção para a chuva que também serve de lanterna.
- Necessaire com remédios e tudo o que precise em clima extremamente úmido porque não tem onde comprar. Importante repelente e protetor solar.

Capa de chuva, saco estanque, botas, boné e garrafa d’água para abastecer nos bebedouros são fornecidos pela hospedagem.
Como chegar aos lodges Napo

Pode ir de carro ou ônibus em uma longa viagem, ou pegar um voo de Quito para a cidade El Coca com duração de 30 minutos. No aeroporto Francisco de Orellana, o pessoal do Napo te recepciona e leva para o porto privativo de onde partem os barcos até o Parque Nacional Yasuní. São duas horas de navegação pelo rio Napo em embarcações adaptadas com poltronas confortáveis, salva-vidas e cobertura de plástico em caso de chuva. E funciona porque choveu forte na volta e nenhum dos passageiros ou bagagens chegaram molhados.
Voltando à chegada, quem fica no Napo Wildlife Center desce do barco a motor e segue em canoas a remo por igarapés até o lago Añangu, o lodge fica nas suas margens rodeado pela floresta. Não precisa remar, os guias são bem fortes e ágeis. Já os hóspedes do Napo Cultural Center continuam por mais alguns quilômetros pelo rio Napo até chegar na comunidade Kichwa Añangu, as cabanas ficam no meio entre a escola e o centro comunitário.
El Colca
El Colca é conhecida como Porta do Amazonas desde a expedição do espanhol Francisco de Orellana, em 1541. É a zona mais urbana da Amazônia equatoriana, localizada na confluência dos rios Coca e Napo. Não cheguei a conhecer a cidade, mas acho que vale se programar para ficar uma noite.


Por fim
Não abracei nenhuma árvore na Amazônia Equatoriana por receio de tocar nos insetos venenosos, mas me senti abraçada pela densa e profunda selva tão bem preservada pela comunidade Kichwa Añangu.
Obrigada, Ministério do Turismo do Equador, Adventure Travel Trade Association (ATTA), Napo Wildlife e Cultural Center pela oportunidade de viver essa linda experiência.
© Todos os direitos reservados. Fotos e relato 100% originais. Imagens sem marca d’água de Hassen Salum.
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